Essa história de se encontrar

escrito por Murilo

Quatro da tarde. É o horário que o sol bate na janelinha e  me cega enquanto trabalho, como que para mostrar sua imponência perante a luz fraca do monitor. Ultimamente o sol muito tem dado  as caras. Há muitos dias não se vê chuva em Curitiba e, quando chove, eu mal percebo, pois ando de carro.
Mas o que é isso? Eu estou mesmo falando sobre o tempo? Que babaca.

Dias bonitos. Esquisitos.

Saí para fumar um cigarro. Havia comprado um maço ontem e ainda restavam alguns. Estranho, maços não costumavam durar tanto. Na volta peguei um café, mais por prazer do que por necessidade.

Alguma coisa aconteceu aqui dentro. Alguma coisa muito séria.

Soube que um amigo meu vai se casar. O curioso é que não me senti tão contrariado com o fato. Coloquei meu fone. Não consegui identificar o que tocava, dentre os tantos gigabytes daquela pasta de músicas. Era um som alegre e bunda-mole. Devia falar de amor.

Até eu, Brutus? Eu que caminhava com volume alto e cabeça baixa, ouvindo bandas brutais a machucar os meus ouvidos. Eu que andava sob a garoa fina e o vento frio, emputecido, segurando cada lágrima para que se transformasse em veneno. Eu que achava que paixão era amor.

Risadas, risadas. Alegria, alegria. Estranhos esses dias, certos demais.

O sol já desceu por completo. Convidam-me para um happy hour. O boteco não parece mais tão atraente como antigamente, mas aceito. Não bebo muito e ninguém ali o faz. Ao pagar, eu que já contei moedas, mal confiro a conta antes de passar o cartão. Estou confuso.

Eu que chegava em casa embriagado e escrevia cartas que nunca seriam entregues a suas destinatárias. Garranchos carregados de desabafos e confissões, muitas vezes indecifráveis no dia seguinte.
Hoje, sóbrio, mando um SMS de boa noite a uma só mulher, sabendo que ela responderá um adorável  bom dia pela manhã.

Antes de dormir, algo me vem à cabeça. Abro o moleskine empoeirado e da caneta sai um haicai torto, quase do avesso.

Sensação boa, mas terrível,
essa de se encontrar,
se habituado a estar perdido.

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